Os blocos de pesquisa, criação e serviço como ferramentas de personalização

23 setembro 2018

Descrição da experiência

O Instituto de Secundária Quatre Cantons de Poblenou em Barcelona está compromissado desde sua criação, com o aprendizado baseado em projetos, as metodologias de indagação e o aprender fazendo. Com o passar dos anos, os projetos tornaram-se o eixo em torno do qual gira a vida da instituição com uma dedicação de 12 horas semanais, praticamente 40% das horas letivas. O restante da carga horária é distribuído entre as disciplinas instrumentais, com 12 horas, e as disciplinas optativas, orientação escolar e educação física, que ocupam outras seis horas. Nessa linha, o curso 2017-18, a partir da proposta dos BRCS (blocos de pesquisa, criação e serviço, por sua sigla em catalão Blocs de recera, creació i servei) para alunos de 3ª e 4ª da Educação Secundária Obrigatória (ESO), a instituição avança rumo a uma maior personalização do aprendizado escolar.

Quadro sinóptico da prática

Quadro sinóptico do contexto institucional e comunitário

Horário semanal de 3ª e 4ª ESO

No curso de 2016-17, os alunos de 3ª e 4ª ESO realizavam de forma contínua dois projetos em paralelo de cinco semanas de duração, desenvolvendo um total de 12 projetos ao longo do curso. Esses projetos podem ser de dois tipos: trabalhos globalizados por centros de interesse (TGCI) e trabalhos globalizados de proposta externa (TGPE). Os primeiros eram oferecidos ao longo de todo o curso, enquanto os segundos apenas duas vezes: no outono e na primavera. Os projetos TGCI realizavam um tratamento transversal dos conteúdos curriculares, incorporando conteúdos de áreas como ciências sociais, ciências naturais, educação visual e plástica ou tecnologia, junto com conteúdos de línguas e matemática, a fim de trabalhá-los de forma integrada e contextualizada. Por seu lado, os TGPE compartilhavam esse caráter transversal e implicavam também a realização ou solução de uma tarefa, um problema ou um serviço proposto por uma entidade de fora da instituição. Nesses últimos, os alunos podiam escolher qual projeto específico realizar entre as onze propostas oferecidas em cada uma das duas edições, outono e primavera (ver Trabajo Globalizado de Propuesta Externa, TGPE).

Apresentação do livro BRCS Poesia e +

Os BRCS, assim como seus predecessores, os TGCI e os TGPE, enfatizam a importância da experiência prática no aprendizado, estruturam-se em torno de metodologias de indagação e realizam um tratamento transversal dos conteúdos curriculares. Sua duração é igualmente de cinco semanas. A novidade é que a cada cinco semanas são oferecidos 12 projetos dentre os quais os alunos podem escolher livremente dois deles, de acordo com seus interesses e necessidades, sem nenhum tipo de restrição. Desta forma, ao longo de um curso cada aluno participa de 12 BRCS que pôde escolher entre uma oferta de aproximadamente 70 projetos diferentes. Deve-se considerar que aqueles que são mais bem-sucedidos entre os alunos são oferecidos novamente em vários períodos, como é o caso, por exemplo, do BRCS sobre sexualidade e aquele dedicado à criação de videogame.

Os temas do BRCS são muito variados e estão organizados em torno de doze áreas ou campos: biomedicina, cultura audiovisual, criação artística, criação literária (catalão e espanhol), criação musical, conflitos históricos, expressão corporal e atividades físicas, pesquisa científica (biologia e geologia ou física e química), pesquisa histórica ou social (conflitos atuais), programação e design, projetos e aplicações tecnológicas e atendimento às pessoas. Assim, como exemplos, na área da biomedicina encontramos um BRCS sobre a estimulação sensorial das pessoas afetadas pela doença de Alzheimer; da área de cultura audiovisual, propõe-se o desenvolvimento de uma campanha publicitária; na área de criação literária, um BRCS apresenta aos alunos a possibilidade de criar um videolit para, por meio de palavras, imagens e sons, dar sua visão particular de um texto literário; a área de pesquisa científica propõe um BRCS que pesquisa como é o interior da Terra; na área de projetos e aplicações tecnológicas, projetam um aplicativo para ensinar os alunos do ensino fundamental a somar; e da área de atendimento às pessoas, é oferecido um BRCS para analisar alguns dos problemas sociais do bairro.

Maquete virtual de Can Felipa, em Barcelona, do BRCS de arqueologia industrial.

Uma boa parte dos BRCS envolve a colaboração com entidades de fora do instituto, a maioria delas do bairro onde está localizada a instituição, o Poblenou, assim como seus predecessores, os TGPE. Atualmente, participam da instituição mais de 25 entidades, como museus, associações esportivas e culturais, fundações sem fins lucrativos de ajuda a grupos especiais ou centros de pesquisa, entre outras. Estas entidades formulam uma proposta ou tarefa aos alunos em torno de uma situação ou problema real relacionado ao trabalho de pessoas do seu próprio bairro ou de comunidades vinculadas ao mundo da cultura, da comunicação, dos serviços, da criação e da pesquisa. Assim, por exemplo, uma comunidade de músicos do bairro Nou Pop, em Barcelona, desafiou os alunos a organizar um festival para adolescentes; uma livraria do bairro solicitou que editassem e promovessem um livro; o Centro de Recursos Pedagógicos do distrito encarregou os alunos de projetar e elaborar maquetes virtuais e reais em 3D de edifícios característicos no bairro; e a organização da XVI edição do festival Escena Poblenou pediu que montassem uma pequena peça teatral.

Cartaz do BRCS de criação musical para o festival Nou Pop.

O objetivo dos BRCS é que os alunos, a partir do trabalho com os conteúdos curriculares das áreas específicas às quais os BRCS estão vinculados, bem como de outras áreas que sejam afetadas pelo projeto, desenvolva cinco competências essenciais:

  • o pensamento crítico (selecionar informações relevantes, prever as consequências, encontrar evidências, avaliar etc.);
  • o pensamento criativo (conceber, imaginar, criar etc.);
  • o pensamento analítico (documentar-se, buscar informações, comparar fontes etc.);
  • a capacidade de colaborar (subordinar interesses pessoais a objetivos coletivos, unir vontades, compartilhar responsabilidades e compromissos etc.); e
  • a capacidade de comunicar (transmitir ideias e argumentos de forma clara, rigorosa e convincente, utilizar tecnologias para facilitar a expressão das ideias, convencer etc.).

A oferta de BRCS é concebida para cada trimestre e organizada em dois blocos de disciplinas ou áreas. Os alunos realizam dois BRCS de cada bloco ao longo do trimestre. A tabela a seguir mostra a oferta de BRCS proposta aos alunos de 3ª ESO no último trimestre do curso 2017-18. Os projetos sombreados são realizados em colaboração com entidades externas.

Oferta BRCS do 3º semestre para alunos de 3ª ESO.

Os 24 professores envolvidos nos BRCS, coordenados pelo coordenador pedagógico do colégio, participam de uma reunião semanal de uma hora de duração ao longo de todo o curso para compartilhar e avaliar o desenvolvimento dos projetos que estão realizando, combinar e conceber ações para os projetos dos períodos seguintes. Além dessas reuniões presenciais, a equipe docente dispõe de espaços on-line para compartilhar documentos e recursos.

Organização da oferta e seleção dos BRCS

Em três momentos durante o ano letivo (no início, nos finais do primeiro e do segundo trimestres) os alunos recebem a listagem dos BRCS que serão desenvolvidos nos dois períodos de cinco semanas em que a oferta é organizada durante o trimestre, juntamente com uma breve descrição do conteúdo a ser tratado em cada um deles.

Para cada período, os alunos devem selecionar três BRCS de cada bloco por ordem de preferência. Para orientar essa seleção, os alunos contam com a ajuda de seu orientador de acompanhamento pessoal. Esses professores, que orientam pequenos grupos de 13 a 15 alunos, explicam a oferta de BRCS e resolvem as dúvidas e perguntas dos alunos em sessões de grupo. Também orientam individualmente os alunos sobre os possíveis roteiros que podem percorrer através dos BRCS ao longo do curso. Do mesmo modo, a instituição procura envolver as famílias para que ajudem os alunos na escolha dos BRCS.

Depois de recolhidas as preferências dos alunos, dois professores ficam responsáveis por organizar grupos de 20 a 24 alunos, procurando respeitar as suas preferências. Se, em qualquer caso, não for possível satisfazer essas preferências, a prioridade é dada aos alunos afetados no período seguinte de cinco semanas do mesmo trimestre ou do trimestre seguinte. Os professores envolvidos na implementação dos BRCS, bem como os orientadores de acompanhamento pessoal, são informados da composição dos grupos e dispõem de uma semana para analisar a proposta e, se necessário, propor alguma alteração.

Características dos BRCS

Todos os BRCS, independentemente da área ou áreas a que seus conteúdos se referem e de se são ou não desenvolvidos em colaboração com uma entidade externa, compartilham seis características:

  • I. A abordagem de um problema ou desafio: os BRCS propõem aos alunos um cenário real conectado às suas vidas e são formulados como um problema aberto que os alunos devem definir, pesquisar, especificar e resolver.
  • II. A elaboração de um produto: os BRCS implicam sempre a elaboração de um produto final. Esses produtos podem ser muito variados: um objeto construído, uma apresentação, um serviço, uma obra de arte, um escrito, a organização de um evento etc. Por exemplo, um booktrailer para estimular a leitura dos adolescentes, uma campanha de conscientização e relação aos refugiados, a criação de um itinerário direcionado especialmente a adolescentes em um museu ou a confecção de um pôster com os resultados de uma série de experimentos de nanociências e nanotecnologia, entre outros. São os alunos que decidem as características do produto final que elaboram para resolver o BRCS, bem como os passos a seguir para alcançar isso.
  • III. O trabalho colaborativo: às vezes a elaboração do produto final de um BRCS pode ser realizada de forma parcelada, de modo que diversos pequenos grupos de alunos se ocupem de diferentes partes do trabalho conjunto. É o caso, por exemplo, da publicação de uma coletânea de poemas em que um pequeno grupo se ocupa da diagramação, outro da parte gráfica, outro da impressão e outro da divulgação. Em outros BRCS existe a possibilidade de gerar vários produtos finais, de modo que cada pequeno grupo produza o seu próprio. É o caso, por exemplo, do BRCS de arqueologia industrial, em que cada equipe de alunos elabora uma maquete de um prédio diferente do bairro.
Alunos trabalhando em pequenos grupos.
  • IV. O uso das TIC: alunos e professores dispõem de espaços virtuais em Moodle e Google Classroom, e ferramentas para a criação colaborativa e apresentações e textos ou editar imagens, áudios e vídeos. Os computadores portáteis e tablets também são ferramentas comuns em todas as atividades da escola para acessar fontes de informação a qualquer momento, fazer cálculos ou escrever textos, além de tirar fotografias e fazer vídeos relacionados à elaboração do produto final e documentar o processo. desenvolvimento do próprio projeto. Além disso, alguns BRCS implementam projetos específicos relacionados à programação, design digital ou à robótica com aplicativos como Scratch, MIT App Inventor, Processing, Rhino 3D, SketchUp ou Arduino.
  • V. A comunicação entre alunos: nos BRCS, os alunos são incentivados a apresentar suas ideias ao grupo de turma, explicar as decisões que tomaram e as razões para elas, dar conta do que estão fazendo e quais são seus objetivos, e avaliar de forma crítica e construtiva as ideias, decisões e objetivos apresentados por seus colegas. Em alguns BRCS, essas situações de comunicação são aproveitadas para realizar atividades de coavaliação.
Exposición del BRCS 22@ en una calle del barrio.
  • VI. A divulgação do produto e do processo seguido: as imagens, áudios e vídeos gravados pelos alunos ao longo do processo constituem a matéria-prima para a divulgação pública do processo seguido e do produto final produzido. São realizados eventos de apresentação na escola para todos os alunos, professores e famílias em duas ocasiões, dezembro e junho, de uma seleção dos BRCS desenvolvidos nos períodos anteriores. Os alunos também são incentivados a apresentar o trabalho realizado a um público mais amplo, utilizando, por exemplo, a sala de reuniões de uma biblioteca e às instalações de uma das associações culturais do bairro. Os produtos gerados também são divulgados pelo portal ou pelos blogs da escola.
  • VII. A avaliação do produto e do processo: os indicadores de avaliação são específicos para cada BRCS, embora todos levem em consideração tanto o processo seguido e a qualidade do produto final alcançado, quanto o trabalho individual e coletivo e as contribuições individuais de cada membro do grupo para o bom funcionamento do pequeno grupo.

Reportagem sobre os direitos das crianças veiculada no programa infantil Catakrac da rede Betevé nos dias 10 e 11 de dezembro

Componentes de inovação

Essa experiência faz parte do conjunto de práticas inovadoras incorporada ao projeto de pesquisa “Aprender com sentido. Estratégias, instrumentos e práticas para a Personalização da aprendizagem escolar” promovido e financiado pelo Instituto de Tecnologia, Educação e Aprendizagem, INTEA, da Fundação SM. Em sua versão atual, os BRCS são uma proposta pedagógica e organizacional que propõe atividades complexas e desafiadoras aos alunos e destaca o princípio do “aprender fazendo” típico das metodologias de indagação. Porém, também incorpora elementos que podem potencializar a capacidade dessas metodologias de favorecer e estimular os alunos a realizar um aprendizado com valor e sentido pessoal, entre os quais se destacam os seguintes:

  • Atenção aos interesses e objetivos de aprendizado dos alunos: os BRCS proporcionam aos alunos a oportunidade de selecionar os conteúdos que querem aprender e trabalhar durante uma parte importante de seu horário escolar, oferecendo a eles uma ampla gama de possibilidades de se envolver e aprender melhor.
  • Reconhecimento e aceitação da capacidade dos alunos de tomar decisões sobre aspectos centrais das atividades: além da escolha dos BRCS, os alunos decidem como resolver o problema e tarefa proposta pelo BRCS e assumem o controle do planejamento do processo e da definição das características do produto final.
  • Ênfase em aprendizados social e culturalmente relevantes: os BRCS propõem problemas e tarefas que permitem aos alunos confrontar fenômenos da vida real. Alguns permitem que os alunos participem de atividades e iniciativas comunitárias e outros os envolvem ativa e emocionalmente em projetos sociais que contribuem para melhorar seu ambiente ou para ajudar as pessoas mais desfavorecidas de sua comunidade.
  • Utilização de recursos e oportunidades de aprendizado disponíveis e acessíveis por meio da Internet: a utilização de tablets e computadores pelos alunos é inerente ao desenvolvimento de quase todas as atividades da escola para acessar fontes de informação, fazer cálculos, redigir e editar textos, tirar fotografias, fazer vídeos e áudios, armazenar e compartilhar informações e divulgar os resultados e produtos dos BRCS.

Elementos de aprimoramento da experiência

A fim de aprimorar e expandir a experiência de inovação e continuar avançando em direção a uma maior personalização do aprendizado escolar, a equipe de direção, em colaboração com a equipe docente diretamente envolvida no desenvolvimento dos BRCS, iniciou um processo de reflexão e revisão focado nos seguintes aspectos:

  • A concepção de atividades de ensino e aprendizado que permitam trabalhar sistematicamente as diversas destrezas envolvidas nos três tipos de pensamento que os BRCS procuram promover: pensamento analítico, pensamento crítico e pensamento criativo;
  • a conexão entre os BRCS oferecidos no mesmo período para gerar sinergias entre eles a fim de estimular o aprendizado dos alunos;
  • a articulação dos conteúdos curriculares trabalhados nos BRCS com os conteúdos trabalhados nos demais
  • espaços curriculares (disciplinas obrigatórias, disciplinas opcionais, orientações…);
  • a coordenação entre os professores que implementam os BRCS para o estabelecimento de critérios compartilhados sobre a concepção e o desenvolvimento de atividades e a avaliação dos aprendizados
  • o acompanhamento dos alunos na escolha dos BRCS;
  • o acompanhamento dos aprendizados dos alunos em sua passagem pelos BRCS.

Mais informação

Para conhecer melhor

  • Perguntas, comentários, sugestões: entre em contato com Ramon Grau (diretor do Instituto Quatre Cantons). E-mail: [email protected]

Autores:

  • Equipe de direção e corpo docente do INS Quatre Cantons.
  • Equipe de pesquisa INTEA – Aprender com Significado. GRINTIE, Universidade de Barcelona.